Na pequena estante de meu quarto de solteiro, havia pouco mais de trinta volumes. Quase todos de Camilo, alguns de Fulton Sheen e Mário Gonçalves Viana, e meia dúzia de Marden.
Nos livros de Marden moldei o carácter, e arquitetei a pouca cultura que adquiri ao longo dos anos, e com Mário G. Viana aprendi a pensar e a formar opinião.
Entre as obras da juventude, a que mais me impressionou, foi “ A Arte de Estudar “ de M. G. Viana. Havia nela curioso diálogo, travado entre professor e aluno do Colégio da Trindade, de Oxford, que obtivera diploma.
“ O estudante acabava de concluir o curso e resolveu ir despedir-se do diretor:
- Senhor diretor: como acabei a minha educação, vou-me embora amanhã.
Ouvindo isto, o austero mestre exclamou, entre surpreendido e irónico:
- Como pode ser isso? Acabaste de dizer, se não estou em erro, que concluíste a tua educação? Pois, meu rapaz, fica sabendo que eu ainda só agora sei que verdadeiramente comecei a saber alguma coisa!”
Na escola, aprende-se o básico, os alicerces, onde assenta a estrutura da nossa cultura. Nada mais.
Saber: aprende-se com a experiência e constante estudo.
Sei bem que se dá mais valor ao “ canudo “, passado pela Universidade, que ao conhecimento adquirido por autodidatismo. É engano, em que muitos costumam cair.
Cesário Verde – a exemplo de outros ilustres intelectuais, conhecedores da ignorância das massas, – matriculou-se na Faculdade de Letras, para obter respeito no mundo da Literatura!…
Erasmo (cito “ Erasme”, por Léon-E. Halkin) também sabia que para se ter mérito reconhecido, é preciso ser doutor e ir ao estrangeiro.
Diz Erasmo: “ Duas coisas, sinto-o, se me tornam verdadeiramente necessárias: em primeiro lugar ir a Itália para dar à minha cienciazinha autoridade desta ilustre estadia; depois obter o grau de doutor. Ambas as coisas são igualmente absurdas: ninguém muda de espírito por atravessar o oceano, como diz Horácio, e não regressarei com mais sabedoria, nem como um cabelo. Mas os tempos são assim; ninguém, mesmo as pessoas mais sensatas, acredita no vosso mérito se não vos poder chamar Mestre.”
Os nossos Mestres da pintura, escultura e música, não o são só por serem geniais, mas porque foram a Paris, e frequentaram o meio artístico da Cidade da Luz.
Do mesmo jeito, como hoje se vai obter o mestrado ou doutoramento, aos Estados Unidos, e a famosas Universidades Europeias.
Dentista de meu pai, tinha no consultório, encaixilhado a prata, certificado de estágio de cinco horas, em São Paulo! …
Era para impressionar… O povo, que não sabe avaliar pela própria cabeça, mede o saber, pelos – diplomas, prémios ou pareceres de críticos e comentaristas.
Olvida, que na maioria das vezes, as opiniões são dadas por amizade ou por serem correligionários – no partido politico, ou associação secreta….ou quase.
Se lhe dizem que a obra é boa, que é best-seller, adquirem-na, para oferecerem, afirmando, a pés juntos, que é excecional….e muitas vezes nunca a leram…
Nada há mais influenciável que a opinião pública – basta repetir, afirmar, elogiar na mass-media, para ser vendido e estar na moda.
A competência, o mérito, seja de quem for, só é reconhecido pelo diploma, prémios recebidos ou testemunho de personalidades influentes.
Por isso há tanta gente culta, sem diploma, que passa por ignorante, e tantos diplomados, considerados sapientes, e que nada sabem… mas são escutados atentamente, graças ao certificado que penduraram no escritório.
HUMBERTO PINHO DA SILVA - Porto, Portugal