segunda-feira, 16 de maio de 2011

Pode o condomínio propor ação de reparação por danos morais em nome dos seus condôminos?


Por Luiz Carlos Nogueira

nogueirablog@gmail.com


O condomínio não pode propor ação de reparação por danos morais em nome dos seus condôminos, porque não é parte legítima

No que diz respeito à reparação por dano moral, esta é personalíssima e intransferível, conforme decisão do Superior Tribunal de Justiça, acerca da titularidade para pleitear tal direito em juízo. Segundo decisão da maioria da Terceira Turma do STJ, a pessoa que tenha sofrido danos morais é a única que pode entrar com um processo pleiteando uma indenização para amenizar o dano à sua honra, não sendo permitido nem aos herdeiros diretos do ofendido. (Resp 302029/RJ – STJ – 3ª Turma - Rel.: Ministra NANCY ANDRIGHI – Julgado em 29.05.2001 - DJ de 01.10.2001).

Em seu voto a Ministra NANCY ANDRIGHI citou o escólio de WILSON MELO DA SILVA, in O Dano Moral e Sua Reparação, 3ª Ed., Rio de Janeiro, Forense, 1999, p. 648-649, assim transcrito:

"Outra conseqüência da regra que só manda reparar o dano moral quando o mesmo exista efetivamente é que, dado seu caráter eminentemente subjetivo, jamais se transferirá ativamente a terceiros, seja pela cessão comum, seja pelo jus hereditatis.

(...)

Os danos morais dizem respeito ao foro íntimo do lesado. Seu patrimônio ideal é marcadamente individual, e seu campo de incidência o mundo interior de cada um de nós.

Sua personalidade estaria, para esse patrimônio moral, como um verdadeiro suporte, correspondendo, mutatis mutandis, à substância de Locke, sustentáculo e base dos bens morais, deles participando ao mesmo tempo.

Os bens morais são inerentes à pessoa, incapazes, por isso, de subsistir sozinhos.

Desaparecem com o próprio indivíduo.

Podem os terceiros compartilhar da minha dor, sentindo, eles próprios, por eles mesmos, as mesmas angústias que eu. O que se não concebe, porém, é que as minhas dores, as minhas angústias, possam ser transferidas de mim para terceiro.

Isto seria atentatório da própria natureza das coisas, e, materialmente, impossível.

Não existe, pois, jus hereditatis relativamente aos danos morais, tal como acontece com os danos puramente patrimoniais.

A personalidade morre com o indivíduo, arrastando atrás de si todo o seu patrimônio. Só os bens materiais sobrevivem ao seu titular."

Aliás há uma outra particularidade a ser observada. É que na eventualidade de uma audiência em Juízo "[...]- O depoimento pessoal é ato personalíssimo, em que a parte revela ciência própria sobre determinado fato. Assim, nem o mandatário com poderes especiais pode prestar depoimento pessoal no lugar da parte. Recurso parcialmente provido." (REsp 623.575/RO, STJ – 3ª Turma - Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, julgado em 18.11.2004, DJ 07.03.2005 p. 250)

Só a pessoa que sofreu o dano moral é que tem que produzir as provas necessárias ao julgamento.

Como exemplo mais recente de uma postulação dessa natureza, temos um caso em que o Condomínio do Edifício Verdes Mares da cidade do Rio de Janeiro (RJ) ajuizou ação cominatória de obrigação de fazer, com pedido de antecipação de tutela, cumulada com pedido de indenização por danos materiais e compensação por danos morais contra a construtora e a incorporadora Plarcon Engenharia S/A, sob a alegação de que o prédio construído apresentava problemas na fachada, com desprendimento dos revestimentos e infiltrações nas áreas comuns e nas unidades autônomas.

Em seu voto a relatora, ministra Nancy Andrighi, deixou claro que o objetivo do condomínio era de estabelecer sua legitimidade para postular reparação por danos morais, em juízo e em nome dos condôminos, sob a alegação de ofensas morais que os mesmos teriam sofrido, o que não é permitido, ou seja, o Condomínio postulou, em nome próprio, direito alheio, o que não encontra amparo na lei processual civil e na doutrina.

Segundo a ministra relatora, a Lei n.4.591/1964, que dispõe sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias, não prevê a legitimação extraordinária do condomínio para que, representado pelo síndico, possa atuar como parte processual em demanda que objetive a reparação dos danos extrapatrimoniais eventualmente sofridos pelos condôminos, proprietários de cada fração ideal, conforme relatou: “A ausência de previsão legal nesse sentido coaduna com a própria natureza personalíssima do dano extrapatrimonial, que diz respeito ao foro íntimo do ofendido, o qual, em regra, é o único legitimado para buscar em juízo a reparação. Por se caracterizar como ofensa à honra subjetiva do ser humano, o dano moral sofrido por cada condômino desse edifício de 200 apartamentos pode possuir dimensão distinta, não se justificando um tratamento homogêneo”.

CONHEÇA O INTEIRO TEOR DO ACÓRDÃO:


Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 1.177.862 - RJ (2010/0018198-0)

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI

RECORRENTE : PLARCON ENGENHARIA S/A

ADVOGADO : JAYME RODRIGO DO VALE CUNTIN PEREZ E OUTRO(S)

RECORRENTE : CAIXA DE PREVIDÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO

BANCO DO BRASIL PREVI

ADVOGADO : DEIVIS MARCON ANTUNES E OUTRO(S)

RECORRIDO : CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO VERDES MARES

ADVOGADO : DAURO FRANCISCO VILLELA SCHETTINO E OUTRO(S)

EMENTA

DIREITO CIVIL, CONSUMERISTA E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONDOMÍNIO. AÇÃO COMINATÓRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. DEFEITOS NA CONSTRUÇÃO DO IMÓVEL. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211/STJ. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. PEDIDO DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS SOFRIDOS PELOS CONDÔMINOS. ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DO CONDOMÍNIO PARA A PROPOSITURA DA AÇÃO. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO LEGAL. NATUREZA PERSONALÍSSIMA DO DANO EXTRAPATRIMONIAL.

1. A ausência de decisão acerca dos dispositivos legais indicados como violados, não obstante a interposição de embargos de declaração, impede o conhecimento do recurso especial.

2. Ausentes os vícios do art. 535 do CPC, rejeitam-se os embargos de declaração.

3. A legitimidade para atuar como parte no processo, por possuir, em regra, vinculação com o direito material, é conferida, na maioria das vezes, somente aos titulares da relação de direito material. O CPC contém, entretanto, raras exceções nas quais a legitimidade decorre de situação exclusivamente processual (legitimidade extraordinária). Para esses casos, o art. 6º do CPC exige autorização expressa em lei.

4. Conforme regra prevista nos arts. 1.348, II, do CC e 22, §1º, "a", da Lei 4.591/64, o condomínio, representado pelo síndico (art. 12, IX, do CPC), possui legitimidade para promover, em juízo ou fora dele, a defesa dos interesses comuns.

5. O diploma civil e a Lei 4.591/64 não preveem a legitimação extraordinária do condomínio para, representado pelo síndico, atuar como parte processual em demanda que postule a compensação dos danos extrapatrimoniais sofridos pelos condôminos, proprietários de cada fração ideal, o que coaduna com a própria natureza personalíssima do dano extrapatrimonial, que se caracteriza como uma ofensa à honra subjetiva do ser humano, dizendo respeito, portanto, ao foro íntimo do ofendido.

6. O condomínio é parte ilegítima para pleitear pedido de compensação por danos morais em nome dos condôminos. Precedente da 3ª Turma.

7. Recursos especiais parcialmente conhecidos e nessa parte providos.

Sucumbência mantida.

ACÓRDÃO (Clique aqui para conferir)

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por maioria, conhecer em parte do recurso especial da Plarcon e da Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil - Previ e dar-lhes provimento para reconhecer a ilegitimidade ativa ad causam do condomínio, apenas para postular a reparação pelos danos extrapatrimoniais sofridos pelos condôminos, e determinar que a liquidação da condenação pelos danos patrimoniais seja realizada através de liquidação por arbitramento, para a fixação do quantum de desvalorização das unidades habitacionais. Vencido o eminente Ministro Vasco Della Giustina, que reconhecia a legitimidade ativa ad causam do condomínio também para postular a reparação pelos danos extrapatrimoniais, mantida a sucumbência na forma como disposta pelas instâncias locais. Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com a Sra. Ministra Relatora. Dr(a). JAQUELINE RIPPER NOGUEIRA DO VALE CUNTIN PEREZ, pela parte RECORRENTE: PLARCON ENGENHARIA S/A. Dr(a). MARCOS PAULO FÉLIX DA SILVA, pela parte RECORRENTE: CAIXA DE PREVIDÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL PREVI. Dr(a). VALERIA ABREU D'ESCRAGNOLLE TAUNAY, pela parte RECORRIDA: CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO VERDES MARES.

Brasília (DF), 03 de maio de 2011(Data do Julgamento).

MINISTRA NANCY ANDRIGHI

Relatora

CONHEÇA O RELATÓRIO E VOTO CLICANDO AQUI

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